COMO SE FAZ SE O TRABALHO DA GESTANTE EM TEMPOS DE PANDEMIA NÃO PODE SER REALIZADO A DISTÂNCIA?
- João Luiz Ferreira

- May 17, 2021
- 5 min read
"A proibição do trabalho presencial da gestante e o direito ao auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença)
Em 13 de maio de 2021, entrou em vigor a Lei nº 14.151/2021, que proíbe o trabalho presencial da empregada gestante durante o período de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus.
Segundo a nova lei, a gestante ficará à disposição do empregador para exercer o trabalho à distância, em seu domicílio.
Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.
Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.
Claramente, o intuito é proteger a gestante e o feto dos riscos, ainda pouco conhecidos, da contaminação pelo novo coronavírus e das sequelas decorrentes da Covid-19.
A dificuldade surge quando o trabalho não admite ser feito à distância.
Nesse caso, há impossibilidade temporária para o exercício da função laborativa habitual, por presunção legal, em razão da condição de gestante aliada ao risco existente no meio do trabalho.
Em outras palavras, o que se tem é incapacidade laborativa por tempo limitado. Situação que, se cumpridos os demais requisitos, gera o direito ao recebimento de auxílio por incapacidade temporária, disciplinado nos artigos 59 a 63, da Lei 8.213/91, e nos artigos 71 a 80, do Decreto n. 3.048/99.
É importante ressaltar que, apesar do antigo nome do benefício previdenciário (auxílio-doença), a lei não impõe a condição de a incapacidade decorrer de uma doença. Nesse sentido, Carlos Pereira de Castro e João Batista Lazzari[1] (2020, p. 671) ensinam:
De outra vertente, o conceito de incapacidade, a nosso sentir, é mais amplo do que o de doença (enfermidade).
A incapacidade pode decorrer, por exemplo, de uma gravidez de alto risco, da adoção de uma medida protetiva (Lei Maria da Penha), ou de uma determinação médica de isolamento, como sói acontecer com pessoas que estão sob suspeita de terem contraído o coronavírus, bem como as pessoas que residem com essa mesma pessoa.
Neste ponto, vale mencionar que, em agosto de 2019, ao julgar REsp 1.757.775/SP, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, mediante interpretação teleológica, demonstrou o entendimento de que não se deve restringir a concessão do benefício a casos de doença ou de acidente.
RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO TRABALHISTA. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. VARA CRIMINAL. NATUREZA JURÍDICA DO AFASTAMENTO. INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PAGAMENTO. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. FALTA JUSTIFICADA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARCIALMENTE. 1. Tem competência o juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade o juízo criminal, para apreciar pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista, por até seis meses, em razão de afastamento do trabalho de ofendida decorrente de violência doméstica e familiar, uma vez que o motivo do afastamento não advém de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher. 2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar, ante o fato de a natureza jurídica do afastamento ser a interrupção do contrato de trabalho, por meio de interpretação teleológica da Lei n. 11.340/2006. 3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha. 4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica. 5. Recurso Especial parcialmente provido, para a fim de declarar competente o Juízo da 2ª Vara Criminal de Marília-SP, que fixou as medidas protetivas a favor da ora recorrente, para apreciação do pedido retroativo de reconhecimento do afastamento de trabalho decorrente de violência doméstica, nos termos do voto. (STJ; REsp 1.757.775; Proc. 2018/0193975-8; SP; Rel. Min. Rogério Schietti Cruz; DJE 02/09/2019)
Assim, em caso de gravidez, tem-se a presunção legal de incapacidade laborativa, se o trabalho não puder ser feito à distância, e não há motivo razoável para a diferenciar de outros tipos de incapacidade.
Todavia, como aludido acima, isso não afasta a necessidade do cumprimento dos demais requisitos da concessão do auxílio por incapacidade temporária:
qualidade de segurado;
carência de doze contribuições, como regra geral;
incapacidade laborativa superior a 15 (quinze) dias;
incapacidade laborativa.
É importante ressaltar que, apesar de a nova lei se referir apenas às empregadas, a proteção deve ser estendida às autônomas e às demais trabalhadoras, sob pena de violação ao princípio da isonomia (artigo 5º, caput, CF). Quanto à data de início do benefício, também se segue a regra de ser devido a contar do décimo sexto dia do início da incapacidade, para a segurada empregada, e do início da incapacidade, para as demais seguradas. CONCLUSÃO A Lei nº 14.151/2021 introduziu a presunção legal de que a gravidez, em período de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus, é causa de incapacidade laborativa. E, por ser assim, se cumpridos os demais requisitos, gera o direito ao recebimento de benefício por incapacidade temporária. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil (1988). Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituição/Constituição.htm>; Acesso em: 15 maio 2021. BRASIL. Decreto n. 3.048, de 06 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto/D3048.htm>; Acesso em: 15 de maio 2021. BRASIL. Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>; Acesso em 15 de maio 2021. BRASIL. Lei n. 14.151, de 12 de maio de 2021. Dispõe sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus.. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14151.htm>; Acesso em 15 de maio 2021. DE CASTRO, Carlos Pereira; LAZZARI, João Batista. MANUAL DE DIREITO PREVIDENCIÁRIO. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2020. STJ. RECURSO ESPECIAL: REsp 1.757.775. Relator: Ministro Rogério Schietti. DJE: 02/09/2019. Disponível em < https://www.magisteronline.com.br/Integras/11000000/84300000/84775309.pdf>; Acesso em 15 maio 2021. [1]DE CASTRO, Carlos Pereira; LAZZARI, João Batista. MANUAL DE DIREITO PREVIDENCIÁRIO. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2020.

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